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Métricas para gerir uma sociedade de investimento imobiliário

Caro(a) leitor(a),

Recentemente tenho feito alguns vídeos e trabalhos onde regularmente surge a ideia de rácios de sociedades de investimento imobiliário.

Ou seja, para quem investe em imobiliário através de uma sociedade, quais são os termos e rácios mais relevantes?

Neste artigo vou rever esses mesmos termos e rácios (embora não vá cobrir rácios de solvabilidade, importantes para a questão do financiamento).

Considero que a sociedade apenas pode gerar dinheiro pelo serviço de arrendamento e pela venda de imóveis.

Termos e rácios de “cash flow” (fluxo de caixa)

A primeira parte que devemos levar em conta numa empresa de investimento imobiliário é a composição dos vários “cash flows” da empresa.

Vários “cash flows”?

Sim, existem na verdade várias variantes do termo “cash flow”, cada uma das quais com um propósito em particular.

As definições que lhe vou dar dos termos e rácios seguintes são uma mistura entre aquilo que são as definições económicas e contabilísticas.

No fundo, o que ler de seguida é a minha própria definição dos vários termos que apresento.

Faturação, volume de negócios, rendimentos e outros

Antes de analisarmos o “cash flow” em si, necessitamos de conhecer a faturação da empresa, ou seja, quanto é que a empresa recebe em rendas ou venda de imóveis.

Neste âmbito, vamos considerar ainda vários outros termos e as definições que tenho para eles:

Rendimento, que na verdade é um pouco mais holístico que “faturação“, porque um rendimento é tudo aquilo que aumenta o valor económico da empresa (aqui excetuam-se contribuições dos acionistas). Ora o valor económico da empresa é maior com o aumento dos ativos mas também com a diminuição do passivo, logo e.g. um perdão/pagamento de dívida de uma empresa também é um rendimento.

Receita – na minha definição, o termo “receita“ é igual a “faturação“. No âmbito de uma sociedade de investimento imobiliário, a receita provém de rendas de imóveis ou da venda dos mesmos.

Volume de Negócios – o “volume de negócios” é a diferença entre a faturação (arrendamento ou venda de imóveis) e do IVA/outros impostos. Como numa sociedade de investimento imobiliário não se aplica IVA (no arrendamento e venda de imóveis), este será - em teoria - igual à faturação.

Ganhos e proveitos – são todos os rendimentos que não estão no volume de negócios.

Cash-flows

Provavelmente já ouviu falar do termo “cash flow” (ou “fluxo de caixa”), no contexto de avaliação de empresas.

Começamos com as divergências nesta matéria.

Primeiro há quem diga que um “cash flow” é unidirecional (i.e. só pode ser de um sentido), o que implica que haja um “cash flow” para os rendimentos e um “cash flow” para as despesas.

No entanto, há precisamente a outra ideia, de que o “cash flow” pode ser um somatório de positivos e negativos.

Em análise financeira sucinta, eu uso a segunda forma (ou seja o somatório dos positivos com os negativos), porém muitas vezes falo dos “cash flows” positivos e negativos em separado, para explicar alguns conceitos.

Além disso, existem vários tipos de “cash flow“ (desde o operacional ou por atividade), porém eu normalmente só uso três “cash flows”: o da empresa (que inclui gastos com pessoal, e outros que não são directamente ligados aos imóveis), o do portfólio (que é a soma dos “cash flows” de cada imóvel) e um “cash flow” por imóvel. 

Por exemplo, vamos admitir um portfólio com 10 imóveis. Todos eles têm um rendimento de 10.000,00€ (dez mil euros) anuais. Entre manutenção, seguros, impostos sobre a posse (IMI), etc a média de custos de cada imóvel é de 1.000,00€ (mil euros) anuais.

Qual é o “cash flow” anual do portfólio, no caso? 

A resposta certa é de 90.000,00€ (noventa mil euros), dada pela fórmula 10*10.000,00€ - 10*1.000,00€.

Ao mesmo tempo, o “cash flow” do portfólio pode incluir ou não obrigações (gastos financeiros com dívida), e normalmente específico o mesmo, tendo o “cash flow” sem obrigações e o “cash flow” com obrigações.

Neste caso, o “cash flow” anual do portfólio, com obrigações, seria, no caso de cada imóvel ter prestações de 2.2000,00€ anuais, de 70.000,00€ (setenta mil euros), dada pela fórmula 10*10.000,00€ - 10*1.000,00€ - 10*2.000,00€.

O "cash flow" sem ou com obrigações pode ser calculado para um imóvel apenas, naturalmente. Por exemplo, se um imóvel tem uma renda anual de 12.000,00€ (doze mil euros), custos diretos de manutenção e outros de 2.000,00€ (dois mil euros) e uma obrigação anual de 3.000,00€ (três mil euros), então o imóvel tem um "cash flow" sem obrigações de 10.000,00€ (dez mil euros) e um "cash flow" com obrigações de 7.000,00€ (sete mil euros).

EBITDA

EBITDA” significa “Lucros antes de Juros, Impostos, Depreciação e Amortização”, a tradução da expressão em Inglês “Earnings Before Interest, Taxes, Depreciation and Amortization”. 

Assim, se pensar sobre o significado do acrónimo entenderá que o principal uso do EBITDA é saber quanto uma empresa gera em termos de caixa (liquidez), levando em consideração o impacto de custos financeiros, contabilísticos e fiscais.

Em termos de sociedades que investem em imobiliário, entendo que é uma métrica que permite saber o real desempenho do portfólio (porque é por excelência uma métrica de eficiência de negócio). Quer isto dizer que um EBITDA decrescente indica, muitas vezes, que a empresa está menos eficiente quanto ao negócio em si (ou seja, sem levar em consideração o impacto fiscal e contabilístico que possa existir no negócio), eliminando fatores externos.

Também é um fator a considerar nos rácios de solvabilidade, e por isso mais uma razão que contribui para entender ser benéfico calcular o EBITDA de uma sociedade de investimento imobiliário. Este rácio é, por isso, particularmente relevante em sociedades que têm dívida, porque os encargos com as obrigações podem fazer reduzir muito o lucro (ou até resultar em prejuízo), o que significa que a sociedade pode estar sobre-alavancada, nalguns ou em todos os seus imóveis.

Devo chamar a atenção de uma coisa importante. Apesar de reconhecer que o EBITDA é uma métrica muito útil para se ter uma ideia geral da sociedade e também do impacto real da contabilidade e fiscalidade no portfólio imobiliário, a verdade é que olhar apenas para esta métrica é enganador, especialmente em sociedades de imobiliário. O EBITDA, repare-se, não leva em conta a depreciação, sendo que a depreciação é sobejamente importante nestas sociedades.

Como se pode calcular o EBITDA?

O EBITDA de uma sociedade pode ser facilmente calculado com base numa folha de balanço (balancete). Para tal, basta conhecer o “lucro operacional líquido” da empresa, que pode ser obtido pela seguinte fórmula:

Lucro Operacional Líquido = Receita líquida - Custo da Mercadoria - Despesas Operacionais - Despesas Financeiras Líquidas

Repare-se, no entanto, que:

  1. Numa sociedade para investimento imobiliário, não existe “Custo da Mercadoria”, a menos que falemos em imóveis comprados para revenda. Estes são efetivamente tratados como mercadoria, em termos contabilísticos.
  1. As “Despesas Operacionais” incluem as despesas com vendas dos imóveis para revenda (ou produtos em geral, que no caso são apenas imóveis) e despesas gerais e administrativas. Ora (ambas) estas também são tendencialmente baixas em sociedades de investimento imobiliário.

Tendo o “lucro operacional líquido”, o cálculo do EBITDA é tão simples quanto adicionar os valores de depreciação e de amortização (que estão considerados nos custos e despesas operacionais). Assim, o cálculo do EBITDA é dado por:

EBITDA = Lucro operacional líquido + Depreciações + Amortizações

Termos e rácios de folha de balanço (balancete)

Pessoalmente, divido as coisas em folha de “cash flow” e folha de balanço (balancete).

É importante ressalvar que existem conceitos de tesouraria, economia, fiscalidade, etc, e cada autor usa determinadas formas para os catalogar.

A minha divisão é feita entre folha de “cash flow” (onde apenas aplicamos conceitos de caixa) e folha de balanço (balancete), onde entram conceitos económicos e fiscais.

Imobilizado

Aqui é onde os próprios contabilistas em Portugal periodicamente adoptaram diferentes nomes para se referir à mesma coisa, mas já lá vamos.

Primeiro, o que é o imobilizado? De uma forma resumida, o “imobilizado” ou os “ativos imobilizados” são bens ou direitos que a empresa adquire e mantém para poder operar.

Por exemplo, uma empresa que fabrica bolos pode comprar (se não quiser arrendar) um edifício com cozinha comercial, um armazém, etc. Não só esse edifício é imobilizado como também o são as máquinas adquiridas para a produção dos bolos.

Em paralelo, podemos naturalmente considerar veículos para o normal desenrolar de uma atividade comercial. Estes também são “imobilizado”.

Porém, o jargão contabilístico mudou nos últimos anos, especialmente desde o Sistema de Normalização Contabilística (SNC), uma sobreposição ao Plano Oficial de Contabilidade (POC), que como o nome indica é uma tentativa de normalizar, entre outras coisas, os termos. A palavra “imobilizado” passou a ser substituída por “ativos fixos”, termo com o qual também eu concordo, mas que é preciso detalhar para se perceber ao certo do que estamos a falar.

Antes de mais: eu não sou contabilista ou fiscalista, nem pretendo ser! Aliás, na ArrowPlus temos já um fiscalista associado a nós, o Dr. Marco Libório, através do seu livro “Como poupar em Impostos no Imobiliário”.

O que aqui lhe vou mostrar, neste artigo, são definições e raciocínios não na óptica de um contabilista mas sim de um analista financeiro. Assim que, estas definições possam causar alguma divergência para um contabilista, assim como alguns termos dos contabilistas me causam a mim a mesma estranheza muitas vezes - sendo o exemplo mais berrante a “depreciação de carros” ou a “amortização de imóveis”. 

Os imóveis não se amortizam. Depreciam(-se) e apreciam. Os carros não depreciam. Valorizam ou desvalorizam e por isso são “amortizados”. Lamento, este tema nem tem discussão. 

Sigamos em frente.

Ativo corrente e não corrente

Primeiramente, e só para que se situe em termos contabilísticos (diferentes do que eu estou a fazer aqui), temos vários tipos de classificação de ativos. Importa ver como a contabilidade da sua empresa de investimento imobiliário vê estes termos, sob o SNC:

No ativo existe o ativo corrente e o não corrente.

Os ativos correntes são aqueles que têm liquidez elevada, como o dinheiro em caixa ou o “stock”. Tipicamente considera-se ativo corrente aquele que se converte em meio monetário 12 meses após a data do balanço, seja para ser negociado ou que seja caixa ou seu equivalente. 

Os ativos não correntes são todo o ativo de carácter duradouro na empresa e que visa permitir à empresa operar normalmente, tendo uma liquidez muito mais reduzida que os ativos correntes. É aqui que incluímos os ativos fixos tangíveis, intangíveis e participações financeiras, que vou falar neste artigo. Pode ver este documento para ter uma noção das rubricas no SNC.

Ativo fixo tangível, ativo fixo intangível e participações financeiras

Na minha definição, o ativo fixo (um tipo de ativo não corrente, em termos contabilísticos) pode ser dividido em 3 grupos, como mosto neste diagrama:

Como podemos ver, os ativos fixos (que se chamam de fixos porque a ideia é que a empresa não os planeia vender) de uma empresa dividem-se em grandes 3 grupos (numa óptica mais reduzida): tangíveis, intangíveis e investimentos/participações financeiras.

Voltemos ao exemplo, para que perceba. Para a empresa que produz bolos, a cozinha comercial e os seus veículos estão no AFT (e possivelmente quando leu isto pensou “assim sendo o imobiliário como tangível também se insere no AFT”, mas já vou a essa parte). No AFI estão por exemplo as patentes que a empresa possui, ou receitas dos bolos que geram royalties quando exploradas por outras empresas, ou as marcas que explora e com as quais gera receita.

As definições destes grupos pode divergir também, consoante os autores. Neste artigo vou simplificar as várias definições, sempre numa óptica do que é relevante para uma sociedade que invista em imobiliário.

O ativo tangível não carece de grande explicação. Já quanto a ativos fixos intangíveis, eu gosto da muito recorrentemente usada definição de Baruch Lev, que no seu livro “Intangibles: Management, Measurement, and Reporting” de 2001 definiu um ativo intangível como um ativo que tem um potencial de retorno futuro e que não possui substância física ou financeira. Existe um livro do Eduardo Sá Silva só sobre este tema - os intangíveis - completamente em Português, sendo que pode ver aqui um extrato

Esta definição é perfeita para o diagrama que apresentei acima porque tudo o que tenha substância física entra no AFT e o que seja de origem financeira entra nos investimentos ou participações financeiras, daí eu a usar.

Ora com base nesta ideia, no exemplo da fábrica de bolos, a compra de um imóvel para arrendamento deve ser tida como uma propriedade de investimento, já numa sociedade que o leitor abra para investir em imobiliário, caso o imóvel seja para arrendamento, então deverá ser colocado como AFT… ou propriedade de investimento.

Por incrível que pareça, não é claro para todos os contabilistas que numa sociedade de investimentos imobiliários, imóveis para arrendamento sejam contabilisticamente tratados como propriedades de investimento ou ativos fixos tangíveis

No artigo científico “Revisitando algumas das atuais perplexidades do conceito normativo de propriedades de investimento – o caso português”, é defendido que um imóvel arrendado deve ser reconhecido como AFT, mas apenas quando o seu arrendamento for a atividade principal da sociedade, e propriedade de investimento quando a atividade de locação é uma atividade secundária para a sociedade.

Já a Comissão de Normalização Contabilística (CNC) afirmou através da sua FAQ que “uma entidade que detenha imóveis para rendimento, seja ou não essa a sua principal atividade, deve, no correspondente tratamento contabilístico, observar o disposto na NCRF 11 – Propriedades de investimento”.

Deixo-lhe esta ideia para debater com o seu contabilista (e perceber quais as diferenças de alocar um imóvel a AFT ou propriedade de investimento). Seja como for, fica claro que o imóvel não poderá estar como AFI…, isso é seguro não fosse a tangibilidade uma das grandes vantagens do imobiliário VS. outros ativos de investimento, como explico no meu livro!

Um abraço,
Artur Mariano.

One comment

  1. Eduardo Ferreira

    Obrigado pela descrição! Espero pela parte II

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